Richard Sloan, professor de medicina comportamental afirmou em entrevista ao site da revista Veja que “Não há nenhuma evidência” de que a fé ajude na recuperação de pacientes.
Ele criticou pesquisadores que promovem estudos sobre o assunto, pois segundo ele, existem erros na forma como esses estudos são conduzidos. “A grande maioria dos estudos tem graves problemas metodológicos” e segundo ele, tais profissionais ferem a ética médica: “A maioria destes pesquisadores está interessada em promover alguma religião”.
Richard é autor do livro “Blind Faith: The Unholy Alliance of Religion and Medicine (Fé Cega: a aliança profana entre religião e medicina, em tradução livre do inglês) e também é conhecido por ser um dos maiores críticos de pesquisas sobre fé e medicina. Para ele, “Ficar doente já é ruim o suficiente. E fica pior se a doença vem acompanhada pelo peso na consciência por não ter sido crente o suficiente”.
Abaixo a íntegra da entrevista de Richard Sloan ao site da Veja. A entrevista aconteceu como repercussão a um recente estudo publicado que afirma que pessoas que possuem alguma religião correm menos riscos de serem hipertensas. Acompanhe:
Que relação existe entre religião e saúde?
Não há nenhuma evidência sólida de que haja relação entre devoção religiosa e boa saúde.
Um novo estudo aponta que pessoas religiosas correm menos riscos de ter hipertensão.
É mais um trabalho que sofre dos mesmos problemas de todos os estudos de observação, que são superficiais.
Quais são os problemas das pesquisas que ligam religião e saúde?
A grande maioria dos estudos tem graves problemas metodológicos. Alguns usam amostras muito pequenas e escondem ou ignoram dados, escolhendo os que dão força às conclusões. Existe um problema na metodologia da literatura médica que é o das múltiplas comparações. Escolhe-se uma ou mais hipóteses e são feitos inúmeros testes. Eventualmente, se acha um resultado que atinge significância estatística, mas isso é metodologicamente inadequado. A religião, talvez, ajude de outras formas. Pessoas religiosas podem fumar menos, beber moderadamente, se exercitar mais… Ou talvez não. Mas como afirmar com certeza que a religião é a responsável por isso? Não é assim que se faz ciência.
O que motiva tantas pesquisas deste tipo?
Pessoas têm diferentes motivações para fazer esse tipo de pesquisa. Mas a maioria destes pesquisadores está interessada em promover alguma religião, alguma atividade religiosa. E usar a medicina para promover religião é uma violação dos valores éticos da medicina. E uma violação da liberdade religiosa.
E por que esses estudos geram tanta repercussão?
Eles sempre atraem a atenção da imprensa. A combinação de medicina é religião é simplesmente muito atrativa para que seja ignorada. Então eles escrevem sobre isso o tempo todo, mas o que escrevem é ruim.
As revistas especializadas deveriam rejeitar estes trabalhos?
Minha visão é a de que não vale a pena. Essas pesquisas não podem ser provadas. São todas feitas com base em observação. Se fosse possível encontrar essa ligação entre religião e boa saúde, e de novo isso é hipotético, o certo a fazer seria procurar os mecanismos que ligam essas questões. A causa é a redução no isolamento social? Religiosos são mais sociais porque participam de reuniões religiosas? Então teríamos um caminho por onde seguir, já que isolamento social de fato é ruim para a saúde. Se fosse possível chegar a isso, a próxima questão seria: o que fazer com essa informação? E o que não fazer com ela? Recomendar que as pessoas se tornem mais religiosas? Incentivar políticas que incentivem as pessoas a desenvolver mais interações sociais de qualquer natureza?
A religião não pode ajudar a dar essa esperança aos pacientes?
Talvez possa fazer com que o paciente se sinta melhor e isso é uma coisa boa. Há evidências de que otimismo, que não é o mesmo que esperança, está associado com saúde melhor. Há estudos confiáveis mostrando isso. Mas não sabemos se podemos aumentar o senso de otimismo das pessoas. Ser otimista pode ser uma característica pessoal. Você não pode receitar isso. Alguns têm, outros não.
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